Imagine entrar em um restaurante e pedir um prato. O garçom traz a refeição, mas não avisa que ela contém um ingrediente ao qual você é alérgico. Mesmo que a comida esteja impecável, a omissão da informação gera risco grave.
Na medicina, o raciocínio é semelhante: o dever de informação do médico é um dos pilares da relação médico-paciente. Mas afinal, até onde esse dever vai? O médico precisa explicar todos os detalhes técnicos? Deve mencionar riscos raríssimos? Ou basta destacar o essencial?
O que é o dever de informação?
O dever de informação é a obrigação do médico de esclarecer o paciente sobre diagnóstico, alternativas de tratamento, riscos envolvidos e prognóstico esperado.
Esse dever está previsto no Código de Ética Médica e também no Código de Defesa do Consumidor (CDC), que, em muitos casos, é aplicado à relação médico-paciente.
A informação deve ser clara e acessível
Não basta informar, é preciso comunicar de forma compreensível. Termos técnicos complicados podem gerar dúvida, insegurança e, futuramente, processos judiciais.
Exemplo: dizer “efeito adverso gastrointestinal” pode não ser tão claro quanto explicar “pode causar dor de estômago ou diarreia”.
Até onde vai a obrigação do médico?
A jurisprudência brasileira tem entendido que:
- O médico deve explicar todos os riscos previsíveis e relevantes, mesmo que raros.
- O nível de detalhe depende da gravidade do procedimento. Em uma cirurgia estética, por exemplo, os tribunais exigem maior detalhamento.
- Não é necessário mencionar complicações extraordinárias ou impossíveis de prever.
Em outras palavras, o médico deve fornecer informação suficiente para que o paciente tome decisão consciente.
Riscos de omissão de informação
Quando o médico não informa adequadamente, pode ser responsabilizado por:
- Danos morais: pela angústia ou surpresa de enfrentar um risco não avisado.
- Danos materiais: em caso de complicações que poderiam ter sido evitadas com a escolha informada.
- Danos estéticos: especialmente em cirurgias plásticas.
Como o médico pode se proteger?
- Consentimento informado escrito
- Documento assinado pelo paciente, detalhando riscos e alternativas.
- Registro no prontuário
- Anotar que explicou verbalmente os detalhes é tão importante quanto o documento formal.
- Linguagem acessível
- Usar metáforas simples ajuda o paciente a entender sem dúvidas.
- Disponibilidade para perguntas
- Abrir espaço para diálogo reduz o risco de mal-entendidos.
Casos práticos na jurisprudência
- Cirurgias estéticas: tribunais têm condenado médicos que omitiram riscos mesmo quando o procedimento foi tecnicamente correto.
- Tratamentos experimentais: exigir explicação reforçada sobre incertezas e possíveis falhas.
- Procedimentos de urgência: em casos de risco de vida imediato, o dever de informação pode ser relativizado, mas nunca eliminado.
Conclusão
O dever de informação é o alicerce da relação médico-paciente. Mais do que obrigação legal, é ato de respeito e humanidade.
A reflexão que deixo é: será que a medicina moderna não exige do médico, além de conhecimento técnico, a habilidade de ser também um tradutor de riscos e escolhas?
No fim, o equilíbrio está em comunicar com clareza: nem omitir, nem sobrecarregar o paciente com termos técnicos, mas oferecer a informação necessária para uma decisão consciente.