Vivemos em uma era de celulares onipresentes. Basta uma conversa começar para que alguém, de forma quase automática, acione o botão de gravação. No consultório médico, essa realidade também chegou: pacientes gravam consultas, muitas vezes sem avisar. Surge então a dúvida: isso é permitido? E como o médico pode se proteger?
O que diz a lei sobre gravação de consultas
No Brasil, a gravação de conversas em que o próprio paciente participa não é considerada ilegal. O entendimento predominante é que, se a pessoa faz parte do diálogo, pode registrá-lo, ainda que sem aviso prévio.
Ou seja, o paciente pode gravar a consulta médica, mesmo sem autorização do médico.
Por outro lado, se a gravação for divulgada de forma indevida, expondo a intimidade do profissional ou deturpando o contexto, o médico pode buscar reparação judicial com base nos direitos de imagem, honra e privacidade.
A consulta médica e o sigilo profissional
O médico está vinculado ao sigilo profissional, conforme o Código de Ética Médica. Esse dever não se altera com a gravação: tudo o que é dito na consulta deve ser tratado com confidencialidade.
Já o paciente, por não ter obrigação ética de manter segredo, pode usar a gravação para:
- Guardar informações importantes sobre diagnóstico e tratamento;
- Acompanhar melhor as orientações médicas;
- Eventualmente, como prova em ações judiciais contra o médico.
Riscos para o médico
O maior risco é a gravação ser utilizada de forma parcial ou descontextualizada, criando uma narrativa distorcida. Uma frase retirada do contexto pode se transformar em acusação de erro ou omissão.
Além disso, o clima de confiança pode ser afetado se o médico sentir que está sendo “fiscalizado” a cada palavra.
Como o médico pode se resguardar?
- Comunicação clara e transparente
- Explicar termos técnicos de forma simples reduz o risco de má interpretação, mesmo se houver gravação.
- Registrar no prontuário
- O prontuário é o documento oficial. Se houver divergência entre o que foi dito e o que foi gravado, o registro escrito tem maior valor probatório.
- Consentimento informado
- Reforçar por escrito riscos, benefícios e alternativas do tratamento é um modo eficaz de proteção.
- Postura profissional constante
- Agir sempre dentro da ética e da técnica elimina receios em relação à gravação.
- Reagir com prudência
- Se souber que está sendo gravado, o médico não deve se opor de forma agressiva. Uma abordagem calma reforça a imagem de profissionalismo.
Jurisprudência sobre o tema
Os tribunais brasileiros têm aceitado gravações feitas pelo paciente como meio de prova válido. No entanto, também têm reconhecido o direito do médico à reparação se o material for manipulado, editado ou divulgado de forma abusiva.
Conclusão
A gravação de consultas é uma realidade que não tem mais volta. Cabe ao médico compreender esse cenário e adotar medidas preventivas para se proteger.
A reflexão que fica é: se o consultório é um espaço de confiança, como equilibrar o dever de sigilo com o direito do paciente de registrar a própria consulta?
A resposta está no tripé da boa prática médica: comunicação clara, documentação adequada e postura ética.